sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

She will be loved



  Nos lábios dela sempre havia um sorriso, daqueles espontâneos que contagiam até o mais desprezível ser. Uma daquelas garotas que não se importa com o mal em volta. Ela transbordava alegria, exalava e atingia quem estivesse por perto. Contagiante? Bom, depende de quem esta perto. Talvez fosse falsa, talvez a alegria fosse de momento. Mas quem iria querer saber? Quem iria se importar com tal detalhe? Talvez o que mais valia no momento fosse a quantidade de pessoas a sua volta. Ela sabia o que precisava pra manter o sucesso e ela tinha, mas o sorriso inicial já não era o mesmo no final da noite. (...)  Ela odiava chorar. Fazia careta, borrava a maquiagem e mostrava toda sua fraqueza. Odiava a si mesma e socava o travesseiro. De quem era a culpa? Ela não queria pensar, nem descobrir no final da madrugada que era dela própria. Mas no fundo sabia o que realmente precisava, havia uma palavra que soava, no fundo de si própria, vazio. O que fazer com ele? Como se livrar dele? São perguntas feitas ao entardecer. (...) O sol se punha, laranja na metade cinza, deitada com os olhos na janela, seus pensamentos rondavam. Ela transbordava palavras, saiam pelos poros, fugiam pelo ar, juntavam a cima da cabeça, e ela tentava transformar em algo concreto. Tentava ler nas entrelinhas, e viravam borrões. E as perguntas se misturavam com a chuva na janela. Nada seria real naquele dia, mas era o que havia.


( - Com Sabrina Marx)


segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A hora do trem passar II



 O chão estava molhado, e das telhas pingavam o que sobrara da chuva. O sol fraco das 18h desaparecia por trás das montanhas, e os trovões ainda ralhavam pelo céu metade cinza, metade azul e rosa. A brisa batia e levantava cheiro, cheiro de chuva. Andava em passos rápidos  fazendo os fones caírem dos ouvidos, freneticamente. Tentava alcança a 15 de Novembro, estava atrasada, muito atrasada. O ar lhe faltava, e mal conseguia respirar, avistou a estação de trem, ele à esperava. Sorriu, como sempre fazia quando o via, e seu sorriso se alargou quando ele sorriu também. Adorava aquele sorriso, era de mostrar todos os dentes, fazia careta e fechava os olhos. Seu sorriso preferido. Também gostava dos olhos, claros e expressivos. Ele a abraçou, ficaram assim, um sentindo a respiração do outro, até a chegada do próximo trem. 

Mais do mesmo II


 Talvez eu desconheça a maturidade dos anos, mas queria, com todas as forças, ser senhora de mim mesma. Tem haver com a solidão que me espera em uma casa vazia ou com o a insegurança da mudança inevitável. O rumo das coisas são incontroláveis à meu poder e isso enlouquece, eu não tenho a direção nem a ordem, e não sei o que será do amanhã, quando nem o hoje mais me pertence.  O futuro longínquo me entristece e tenho medo, medo de que as coisas sejam como eu sinto. Posso esperar o contrario?  [...] Dizem que é preciso viver só o presente, mas isso é inútil pra mim, quando minha cabeça não pára para viver, apenas vê através de tudo e me frustro antes de ter a chance de realmente me frustrar. É que isso pra mim é demais. Eu estou perdendo muito, como se cada minuto respirado, estivesse me sufocando. Eu não vivo, e me pergunto qual é a graça do existir. Eu quero agarrar o mundo e devorar cada pedaço. É pedir demais? [...]
 Anseio pelas mínimas partes, para que tudo seja meu antes do tempo terminar. A vida é tão curta criança, porque passar tão pouco tempo parado, olhando pela janela? Acho que é isso que faz as pessoas caírem no mundo e se perderem pelo caminho, sem querer voltar. E eu fugiria, agora, nesse exato momento. Iria para qualquer lugar que me dessem afago e logo me iria embora. Então, qual o sentido disso tudo?  

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Filhos do Cancêr



 Adorava aquela bagunça. E que bagunça. Pulavam e gritavam, como se o mundo fosse explodir. E eu não os impedia, observava sorrindo, aqueles dois sorrisos nunca os deixavam. Um sorriso acompanhava os olhos, olhos estes que, únicos, eram os mais bonitos que já vi. Eles iluminavam, e não pela sua cor, que eu insistia em teimar; era azul! E ele discordava rindo, ambos sabíamos, poderia ser a cor que quiséssemos. Os queria pra mim, sim, quem não os iria querer? Mas preferia nele, azul, verde, isso não importava. O outro sorriso acompanhava o jeito, jeito este que me fazia a apertar. Vivia no seu mundo, e o compartilhava, falando pelos quatro ventos, tão tagarela quanto eu, e nos perdíamos em cada hora de conversa, tentando achar tempo para tanto o que falar. Ambos tinham a doçura que tiravam o amargo da minha vida. Açucarados com carinho e inocência em mel, sonhavam e me levavam com eles. Dançavam pelo tapete da sala. Ele apertava minhas bochechas e as deixava vermelha e eu o deixava vermelho, pela graça de vê-lo sorrir sem graça e ser ameaçada de cócegas. Ela eu tentava animar, a rodava, como se os problemas fossem ir embora com a música, não parava de rodá-la, enquanto não a via sorrir. Eles me faziam sorrir, e não importa se destruíssem o tapete da sala ou o quadro da sala de jantar. Eles eram meus. 

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

As Duas Torres



“Oi maninha!! Tudo bem?! Estou com saudades! Ta osso agora pra gente se ver, né? Bom trabalho. A Be deixou uma borboleta azul pra você na geladeira.

Estou Bem! Um beijo.”

                                    - Por um desconhecido, entre as páginas 210 e 211. 

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Quando o sol bater na janela do meu quarto.


 Estava a olhar uma caixa de recordações, fotos e mais fotos, e me vi pequena, com meu cabelo para cima em forma de coqueiro- como mamãe dizia- meu rosto infantil provocou meu sorriso e o sorriso largo de minha mãe, que não mudara nada, só seus cabelos, que de imensos e negros, restaram-lhe madeixas negras, papai por outro lado, continua o mesmo resto, um pouco envelhecido pelo tempo, mas sempre o mesmo. Agora o mar, mar que me causa saudades, do tempo que me divertia olhar as ondas só por medo de chegar perto delas. Estava mais infantil, e aquilo me lembrava meu tio a cantar Geraldo Vandré a caminho da serra, Zé Ramalho também participava da viagem, e todos cantavam em uníssono. Pra não dizer que não falei das flores e dos Mistérios da meia-noite. Outra fotografia, nestas vovô e vovó, no mar, comigo ao lado, me lembrando como senti falta de ambos, a alguns anos longe. Nossas faces denunciavam o frio, mais que o céu cinza no reflexo a água. E me pergunto hoje, como agüentamos ficar lá? Sempre fora assim, tínhamos o dom de escolher o mar em chuva, mas eu adorava. E outra vez estava eu, com papai e mamãe, sentada entre ambos, tentando não rir, lembro-me de papai e suas caretas enquanto mamãe brigava para que ele parasse, e ao flash, não consegui segurar o riso. E familiares e mais familiares em mais e mais fotografias. Alguns conheço de longe, outros nunca vi, mas os outros sempre estiveram aqui. Vi-me cheia de brinquedos, a cozinhar no fogão de plástico que ganhei depois da internação, as bonecas ao meu redor e me fez querer voltar a infância. E por fim, me vi junto a todos, descíamos a serra e Os Incríveis nos embalava. Era um garoto e como eu amava os Beatles e os Rolling Stones me fazia rir. 

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Tempo de Pipa

  Os olhos dela brilharam e então, se apagaram como uma estrela cadente que se perde na escuridão. E eu estava perdido. Abracei-a, com todas as minhas forças, abracei-a. Seus cabelos brancos cheiravam a Naftalina, mas eu não me importava. As minhas lagrimas caíram e escorreram pelo rosto dela, pálidos e calmos, como o dia em que a conheci, e percebi que não importava os anos, eu sempre iria me lembrar. Suas rugas continuavam, mas o aparente cansaço da velhice havia ido, e eu desejava eles de volta, mais que qualquer coisa. [...] Ela me deixou. Depois de sessenta e três anos, ela resolver ir embora, e eu teria de voltar sozinho para casa, sem ninguém a quem culpar, só mais um velho ranzinza sem motivos. Ela me ouvia, deixava ser meu motivo de frustração, calada, enquanto me servia café e se sentava ao meu lado. Os anos se passaram, as gerações mudaram e nós continuamos, eu e ela, no mesmo lugar, na mesma mesa, no mesmo caminho. Ela nunca me deixou ir embora, por que, oh Deus, ela teve de ir então?
 E então eles adentraram o quarto; - “Vovó? Vovó?” e sentados ao redor dela, me perguntavam, mas eu não conseguir dizer, não enquanto minhas mãos, enrugadas e frias, estavam com as dela.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Canção de ninar


Colocou um grande chapéu, encobria-lhe os olhos e mal a deixava ver. Com as vestes largas, muito maiores que seu pequeno corpo, a fazia tropeçar, e os saltos? Tão grandes eram que seus pequenos e finos dedos ficavam perdidos dentro dele, e seus passos estranhos a faziam tombar. Fechou o guarda roupas, e estava pronta, logo ela chegaria. O risinho de criança travessa denunciava ao pai, que parando em frente ao quarto a surpreendeu com uma enorme gargalhada. –“Oras, o que és isso?” Perguntou entre os risos. –“Uma surpresa para a mamãe!” E com um bico mimoso de vermelho borrado, respondeu. E sem responder o homem saiu, deixando pequenas risadas no ar. Parou em frente ao espelho, e pensou ser adulta, dona de imensas responsabilidades, ou que sabe uma princesa? Rodou e rodou, nos sapatos maiores que os pés, e sentiu como se pudesse ser qualquer coisa, e até mesmo tão forte quando a dona das peças. Ouviu a porta bater e uma escrava adentrar o aposento eufórica; -“Mas o que e isso? Quanta bagunça! E sinhá já chegou!” Bradou em desespero, enquanto apanhava peças de roupas espalhados pelo chão. Mas não respondeu, apenas tentou correr escadas a baixo, o mais rápido que seus sapatos deixavam, e pulou sobre a mulher que risonha a saudou. –“Não tens jeito, não é?” E em resposta a pequena apenas a abraçou. E voltou a usar aquelas roupas, anos depois, quando a velhice batera na porta da mais velha, e fora levada. As roupas, já descoradas e velhas, serviram-na, debruçada em lagrimas sobre o corpo, abraçou-a pela ultima vez.

Pelo vinho e pelo pão




Olhando para os séculos passados e os que estão por vir, só vejo poeira, uma grande e densa poeira. Porque o ser humano é somente isso aos olhos de quem está em cima. O breu de ajuda e a massa de necessidade onde reina o capitalismo – ou fascismo abstrato, para quem vê além disso.- A população cresce e o ser da sociedade acaba, se extermina. Sobre uma face os heróis e os vilões do outro lado da moeda. A esquerda, direita, ambos os lados e lado nenhum, são somente divisões do parlamento, que falar por falar é a única direção certa. São canibais de primeiro mundo, onde o pensar do outro lado das torres de decisão são proibidas por leis que nunca foram faladas. [...] Gritarias e cartazes erguidos na avenida, enquanto na torre mais alta, eles riem de quem está tentando mudar o mundo. Coroas e cetros substituem ternos e cérebro, pra quem enxerga sua cadeira como um trono. E então quem segura os cartazes desiste, sem apoio. E quem se envolveria? [...] E as aspas fazem o trabalho do chamado governo, dominando o plural do imperfeito.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Blitzkrieg Bop


  O crepúsculo se iniciava, a vermelhidão rotineira tomava a imensidão e eu a observava em meio aos risos e as conversas bobas. Eram assim, todas as tardes, cheias de abraços e palavras mal colocadas que gerava risos o caminho inteiro. Minhas costas doíam, os pensamentos vinham como pássaros ligeiros que logo me escapava, eram muitas coisas, todas bobas, mas que me perdia, por alguns minutos, mas os risos delas me acordavam novamente. Mil e um livros e faltava-me braço, espaço e força, e as mãos eram dadas, ao atravessar correndo as ruas que eram menores que nosso medo de caminhar. Era quase morrer todos os dias. A imaginação corria solta pelo caminho, palavras no ar, e risos, apenas risos. Gritos, músicas, lugares e fotos. Puxões e cuidados, broncas de quem se preocupa. E em espaço nosso comandávamos a bagunça, não existia mais nada, éramos nós e nosso jeito de querer agarrar o mundo com as mãos, mas suspeito ainda, talvez conseguíssemos. Gostava daquilo, como gostava do café da tarde em companhia boa, depois de uma tempestade, quando ainda se ouvi os pingos do telhado. Como ver meu pai com violão nos braços prestes a entoar canções e minha mãe rir na cozinha.
Gostava tanto que não queria me despedir e nos momentos de separação, era como se tirassem meu cobertor em meio ao frio. Dizia adeus, como quem espera o próximo dia, quem espera o próximo ‘oi’. Éramos um abraço e tanto. [...] Falava e falava, e me pergunto agora, como me agüentaram? Não o sei, mas agradeço-lhes por isso. Eles eram o complemento, era como se sentir em casa. E a falta dos últimos dias é das tardes que o mundo era nosso, somente nosso, de mais ninguém.

Vila do sossego.


 Com pura simplicidade e sinceridade, sorria. As pessoas rodeavam o local, mas ninguém o via, e se via, não lhes dava importância, só ignoravam. Ele sorria . Os primeiros acordes foram entoados e com leveza em sua voz, começou, graciosamente, com as letras decoradas para sons não conhecidos. Sorria, com cada batida de mãos nas cordas, com cada olhar de reprovação, medo e curiosidade. Sorria. O pequeno, de cabeça baixa, entoou então, em acompanhamento e com voz de menino moço, cantavam. “[...] Com precisão!”. Suas vestes, tão sujas e mal tratas denunciavam a pobreza aparente, aquela que a situação empoe, mas não a alma. Sorria. E com sincera admiração me aproximei. “[...] Com aflição”. Observei aos pés do pequeno um chapéu com miseras moedas, e depositei as minhas, que não eram muitas, mas sinceras. Olhei com sinal de respeito, e admirada dei-lhes parabéns, com um olhar talvez, e sem parar de cantar agradeceu, como que reverencia, e lisonjeada sorri, maravilhada. Com alguns passos para trás, fiquei.  “Com devoção!” E então a música parou e sem hesitar a ovação, bate minhas mãos, e as palmas foram altas, e todos olhavam sem entender, mas eu entendia, e ambos que estavam em minha frente também. Sorria. Parabenizei e me retirei como quem rasteja. Sua talvez felicidade era transmitida a quem o enxergasse, com sorriso recebia a todos, eram boas vindas e volte sempre, e em senti obrigada a voltar, ouvir a vozes que entoavam profundo desespero por sorrir.

domingo, 3 de junho de 2012

Perfeição


 Dissimulada era, menina que enganava e ria, ria de quem não conhecia seus truques, truques esses que sei bem, sei-o tanto que não me enganas mais, menina má de risada escura. O primeiro golpe fora rasteiro, quase que não acerta-me, quase que não percebo, passou rápido e pisquei sem entender, se era o que parecia ser. Com os braços abertos ela lhe enlaçava, como uma serpente rastejante, pronta para dar o bote. Com seus afagos carinhosos ela lhe envolvia, teia de mentiras que te enroscava sem perceber.
A segunda fora cruel, mas não para comigo, vi acertar a outro, e como sutil era, ninguém percebeu, nem mesmo a recém vitima que com dor fora formada, que a abraçara em busca de consolo. Envolvia fácil, menina traiçoeira que cobiçava o mundo, com seus passos planejados e as mascaras que era trocada a cada aurora a espera do anoitecer. O terceiro golpe fora fatal, o ultimo que dera, acabara com tudo, e em cima dos destroços colocara um trono e se intitulara rainha, rainha do que não lhe pertencia. Uma manta negra fora jogada em seus ombros e seu cetro de maldade posto em uma das mãos. Observei-a naquele dia, e tudo então fizera sentido, como pude m deixar levar por um belo par de olhos que nunca me dizia nada? E então a distancia me pegara e me pusera em seu colo, ninou-me e me fez vencer por mim mesma. E ela? Continua por ai, solta com seus cílios a bater e com seus pensamentos a tramar, dominando todos os que lhe entregue confiança.

sábado, 2 de junho de 2012

La Maison Diel


Arrume um encosto, ajeite os travesseiros e se enrole no cobertor. Coloque um filme que te faça chorar, e mesmo que o casal não termine junto, mesmo que estória não faça sentido, assista. Pegue toda a quantidade de chocolate e sorvete que tiver, não se preocupe com o peso ou as gordurinhas a mais, é só um dia afinal. Depois só aperte o play. [...] Se encontre em cada personagem, seja no nariz ou nos gosto, se sinta em cada momento, em cada fala. Se irrite e diga tudo o que tem vontade para seus personagens e suas falas não aceitas e momentos impróprios. Prenda o fôlego e não pisque os olhos enquanto não achar seguro. Aperte a almofada ou um ursinho de pelúcia. Deixe seus olhos brilharem e inveje as cenas românticas, se ponha no lugar dos personagens, nas caminhadas de mãos dadas num parque qualquer, em um jantar a luz de velas ou em brigas com seus finais em lençóis e camas. Se emocione e segure as lagrimas presa nos olhos. Chore. Desconte nos créditos finais toda a sua raiva, sua insatisfação pessoal e suas vontades. Não saia de casa. Durma. Sonhe e esqueça que dia é. Não pergunte as horas. Vai acabar, não é o fim do mundo garota. Não pense, não espere. Ursos, flores e bombos não servem para nada. 

Música Ambiente

Era sempre o mesmo lugar, e eu avistava logo aquele grande e cheio meio de transporte. Lia mentalmente as grandes letras laranja que indicavam o caminho e eu embarcava. Era cheio de pessoas, conversas paralelas, mas eu não ouvia ninguém. Não importa se era 505, Perdidos no Espaço ou Check- up, era sempre aquele mesmo fone, hora em um lugar, hora em outro, a janela sempre era minha maior aliada. Sentada uma vez do lado esquerdo, observava com atenção as curvas que dava e na minha cabeça, quantos acidentes não acontecera ali? Imaginava em cada curva e ria, quando não havia mais escapatória. [...] A viagem era sempre a mesma, os mesmos lugares as mesmas pessoas, o mesmo tempo. As vezes um sorriso me escapava para alguém que estivesse pronto a recebê-lo, outras vezes passava ligeira, pedindo perdões e licenças. Eu cantava com toda minha alma silenciosamente, “You're waiting laying on your side, With your hands between your thighs...” e meus olhos se fechavam como se estivesse sozinha. Mas eram poucos os dias em que esquecia completamente a música e meus olhos brilhavam ao contemplar o céu se alaranjar com a aurora. O sol então dava a graça com seus primeiros raios saindo por detrás das montanhas, e eu não piscava. Acompanhava da janela daquele ônibus o nascer da manhã e às vezes, o fim da noite, com a lua perdendo seu brilho, e as estrelas se apagando, uma a uma. Seguia a lua com os olhos atentos, ela sorria e eu devolvia o sorriso, pronta para repetir Too Afraid to Love You.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

L'âge D'or



A inspiração vem, escolho as palavras certas, crio mil frases em mente, mas quando estou só eu e o papel, elas fogem, correm de mim e da minha mania de deixar elas dizerem quem eu sou. Vêm e vão, como quem brinca de se esconder, sem dar pistas de algo concreto. Isso me aborrece, me faz acumular mais ar, mais rotina, mais vida. E por falar em vida... Oh grande motivo da existência humana que me faz estar presa num mundo tão banal e enfadonho. A ordem natural das coisas entre a minha desordem acumulada, o meu mal jeito de deixar as coisas fazerem seu próprio sentido. Eu nunca espero, e me decepciono quando o que foi adiantado por força está errado. Surpreenderia-me esperar e ver as coisas estarem errado com dicas que nunca tento enxergar? Talvez. Estou cheia desse mundo, nada é certo, nada é bom, e eu estou sozinha em achar que sou a única pessoa certa. São só 6 bilhões, não é verdade? Por que alguém não vem e me mostra um motivo pelo qual a valha a pena lutar? Um único pingo de vontade de viver sem me preocupar com os outros, com o certo, com o estar bom. Mas quando nem eu me acho suficiente para isso, adiantaria esperar para ver as respostas? [...] O mundo, tão cheio de declarações frustradas vinda de corações grandes para corações pequenos. Tão cheio de silêncio com vontades, e lembranças imortalizadas pelo tempo. Talvez não seja só dor afinal. Mas me tranco num mundo secreto e deixo que o que não pode ser provado para mim, seja provado para os outros, e me basta saber que tem gente sorrindo pelo que banalizo. Falta vida nisso tudo, o grande motivo para acordar todas as manhãs e não parar de respirar enquanto dormimos. O amor está no ar, intacto e impalpável, mostrando que a capacidade humana é fraca para sentimento, quem poderia me provar o contrario, quando eu mesma me contradigo o tempo todo? [...] Então acordo com uma vontade de viver enchendo os meus pulmões, oxigenando o coração idealizado e empoeirado que guardo no armário do córtex cerebral, mas me chateia saber que será mais um dia de canções e acenos afirmativos. Eu estou do lado oposto, contra tudo o que a raça humana presa e admira, mas quem vê através do nada? O olhar é incomparável ao ver, e ninguém vê, caros amigos, ninguém vê. Porque talvez o amor exista, e talvez eu nunca saiba.

segunda-feira, 12 de março de 2012

A hora do trem partir

Porque o mundo é grande demais e eu apenas uma, pequena e fria, mínima parte. E minha cabeça não funciona, nestes dias em que parece que o mundo irá me engolir. É nesses dias que toda a minha inexistência pesa sobre meus ombros, pesa demais, me esmaga e me apodrece, e eu me deixo apodrecer, sem tentar lutar contra o que me abala, contra tudo, contra mim mesma. Eu tenho medo da minha loucura, do que as noites de insônia pode me levar a fazer. Pontes altas, rodovias largas, remédios fortes e armas prontas, tudo parece atraente demais para o fim dessa existência medíocre que não parece existir. Você poderia me explica o que é a solidão? Eu, particularmente, não sei, mas gostaria de não senti-la. [...] Tenho medo de existir. Não é um medo comum, eu sei, mas eu só não quero ter que abraçar o mundo, quando nem ao menos consigo levantar da minha cama sem a dor da madrugada. Solidão, menina insistente está, puxa uma cadeira, se senta ao seu lado, e fica, faz companhia, te abraça, esvazia como quem suga as forças, parar se alimentar. E quem pode ir contra algo que nãos e vê? Lutar no escuro, vencer o nada. Mas me alivias saber que talvez isso passe, junto com a vinda da próxima chuva.

sábado, 10 de março de 2012

Paralelo

Está frio aqui, mesmo com o sol ardendo do lado de fora, eu sinto isso, desde que você saiu pela porta dos fundos, eu sinto isso o tempo todo. Seus braços saíram do redor da minha cintura e o chão parece se mover sob meus olhos, eu não estou mais segura, sinto como se fosse cair a qualquer momento, desde que você me soltou para o mundo.   Os seus lábios descolaram-se dos meus, e meus olhos se abriram, mas eu ainda não consigo enxergar, só vejo rabiscos do que antes eram imagens, você me guiava, e eu fechava os olhos e te seguia, sem ao menos me preocupar com o lugar que você estava em deixando. Ah e suas mãos, antes, entrelaçadas nas minhas, agora me fazem sentir medo, medo de tudo, e do nada. E sinto falta dos seus olhos e seu sorrisos, eles me deixavam perdidas, e eu adorava me perder neles, até me perder em você e não conseguir mais achar o caminho pra casa. Você se foi, e eu nem ao menos disse uma palavra, somente se foi, sem deixar-se despedir. 

sexta-feira, 9 de março de 2012

Passos Falsos

Fechou os olhos e como sempre, as últimas palavras dele a calou. A intensidade das verdades que foram jogadas no ar, foram contra seu pequeno corpo, sua pernas perderam as forças, como se fossem sugadas pelo chão. Quis sentar-se ou se jogar contra alguma parede atrás de si, queria apenas algo que desse apoio. Ouviu a porta se bater com força. Ele havia ido embora, de vez.
  -“Aquela estrela, olhe aquela estrela...”
 Imagens de alguns dias atrás invadiram sua mente, a voz dele se difundia com ao som acelerado de seu coração. E então caiu. Desabou e foi de encontro com o chão frio e as lágrimas, enfim, venceram-na, percorrendo seu rosto.
 -“Fica pra sempre?”
-“Fico.”
Eram coisas demais para ela, eram muitas memórias se fazendo presente. Ele não a amava, e tudo fora mentira, uma doce e curta mentira. Fora como subir na nuvem mais alta e vê-la se dissolver sob seus pés, logo não havia mais nada, só o chão e os machucados, recém abertos, e doía demais.
-“Aquela estrela, olhe aquela estrela...”
-“Aquela mais brilhante?”
-“Sim, aquela estrela, ela significa nós dois.”

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Como Uma Onda

Sabe, é irritante como o modo que você se move da minha vida é fácil. Entra sem bater na porta, puxa uma cadeira ao meu lado e fica, até achar que não pode mais, que tem que ir embora, e sai, simplesmente sai, sem dizer ao menos uma palavra.Você está me cansando garoto, mas não percebe, e isso faz mal. E quando estou prestes a trancar as portas você chega, chega e tira as chaves das minhas mãos, mostrando o como é fácil estar no controle e me manter presa. [...] Não vou contar como foi nossa história, de como eu te vi pela primeira vez e de como eu gosto dos seus olhos, sorrisos, voz ou qualquer outra cosia perfeita em você. Não vai ser mais um texto clichê, dizendo o como foi diferente, com começo e meio sem fim. É só que eu estou cansada de dizer tanta coisa, sem ter pra quem. [...] Não vou dizer aqui todo o que aconteceu, em como nossas conversas me deixavam acordada, ou como me senti com seu abraço, essas lembranças não vão ficar presas nas linhas, eu só quero esquecer.[...] E esse texto acaba aqui, você é como minha inspiração, vem e vai embora rápido demais, só lhe peço para ir embora de vez. Você chegou, e foi embora, e eu não tenho mais nada a dizer.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

O bêbado e a equilibrista

Virou outro copo garganta a dentro, o mundo é mais fácil de ser encarado quando não se está sóbrio. O gosto amargo do vinho seco, e barato, rasgavam seu fígado; “Que fígado?” Aquele músculo inútil e podre que não devia mais existir dentro de si. Mais um gole, fechou os olhos em careta desajeitada, não estava pronto a parar, não quando toda a imundice global vinha no ar, direto aos seus pulmões. Aquilo era o inferno e ele estava queimando. Mais um bar, mais um copo, mais uma espelunca com odor de urina e putas transitando para mostrar produto, mas não importava, não se o seu dinheiro pagasse. [...] Deixou as moedas que lhe restaram de mais um dia sujo sobre o balcão, ziguezagueou até a saída, a cabeça pesava sobre os ombros, era hora de ir para casa, sem a emoção da espera, ninguém estaria lá de qualquer maneira. Vadias entravam e saiam, levavam seu dinheiro depois de algumas horas de serviço e gozo rápido, e isso era tudo. [...] Abriu a porta com imensa dificuldade, a fechou e se jogou no sofá surrado ao canto do pequeno quarto. Tateou a cômoda a procura da sua caixa de cigarros, pegou um e o girou entre os dedos, acendeu e o levou a boca, nada melhor que toda aquela nicotina direta para o seu pulmão. Ligou o rádio, deu play e os primeiros acordes de guitarra começaram, o teto rodava e ele gostava dessa sensação, ébrio e sem pensamentos. Soltou a fumaça em um suspiro. Ficaria bem enquanto ficasse assim, até o próximo dia.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Dado Viciado

 Eu queria poder dizer que não deu certo, como outras tantas histórias, como tantos outros casais. Mas, se quer teve começo. É só mais uma daquelas histórias que não leva a nada nem a ninguém, mais uma das minhas histórias que sempre segue o mesmo enredo. A personagem principal continua, mas o parceiro de cena não. O personagem da vez aparece, e as cortinas se fecham antes mesmo de começar o espetáculo. E resta só alguns murmúrios atrás do cenário e algum choro no camarim. É que depois de ensaiar tanto, ver todo o script e o esforço serem ameaçados e arremessados ao lixo dói. Como não saber se história daria certo ou não, se ao menos tivesse começado. Escrevo diálogos, imagino cenas e decoro o script, como se fosse a primeira vez, como se eu nunca estivesse em cena antes, como se nunca tivesse dado errado. Alguns sorrisos, e acho que a história vai ter um final feliz, um gesto não interpretado e drasticamente não sei como continuar, perco as falas, perco o rumo e não sei mais para que lado sair, enquanto os outros observam, sem dizer uma palavra. E esse diretor misterioso e chato que é o destino, acaba com tudo sem me perguntar, ou, simplesmente, bagunça mais ainda.
 E é nesse teatro descontrolado que minha vida entra, me joga no palco sem saber o enredo, e acha graça quando fico estática sem ter o que falar. É mais uma daquelas tantas vezes que improvisei sem saber sobre o que. Na arte de interpretar, as lágrimas não fogem por detrás dos olhos. [...] O personagem muda novamente com diálogos e frases prontas, mas dessa vez serei platéia, e deixar que a história acabe sem mim.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Abre-te sesamo

 Talvez meus sentimentos sejam só uma linha em branco, algo que não se pode entender, por não existir. Mas eu continuo tentando, algum rabisco ou vírgula que seja, mas é só uma linha em branco, afinal. E por sempre esperar que algo aconteça, preferi não esperar por mais nada, talvez férias de toda expectativa muda que inutilmente ainda existe. Férias de todo o cansaço, somente sumir, desejando que a metáfora atravessasse os meus ossos, e se fizesse real. Eu quero mais que um tempo, eu quero dar um tempo no tempo que tem deixado a minha vida parada, imóvel demais parar qualquer coisa, e que me faz lembrar o vazio e o cansaço, e isso cansa. Desnecessário, desnecessário. Quero que tudo volte a girar, mesmo que tudo vá para baixo de vez em quando, só quero sair da mesmice que minha vida tem estado. Eu quero a surpresa do instável e a fragilidade das emoções. [...] Eu não quero me explicar, também não peço para que me entenda, só quero o silêncio acolhedor de ombro amigo, só quero o afago invisível sem sensação ao toque. É pedir de mais? Só quero que o que não foge a regra vire exceção.[...]
 Parei por aqui, é muita linha branca querendo fazer sentido, muita palavra fugindo do significado. Mas e quando você não consegui desistir? Quando algo te puxa pra continuar, mesmo sabendo que não dará certo? Talvez seja o prazer de ver tudo em ruínas. E pra variar nada sai como o planejado, as pessoas não seguem o dialogo, e eu continuo assim mesmo, como se fosse preciso de todas as letras para me fazer ir embora. E eu vou, jogo os jarros nas paredes e bato a porta, dramatizo até o ultimo olhar para traz, e volto. Como se ser posta para fora não fosse o suficiente, eu sempre dependo de esclarecimentos para ir de vez. Não sabe explicar? Eu também não, meu querido, só acho que todos precisam de segundas chances, mesmo quando o orgulho for grande demais para atravessar a fronteira. Não me pergunte o que me faz ir embora, quando nem eu mesma sei. Só quero ser seguida, mesmo que por um ultimo adeus. Eu vou, e meu orgulho trava uma batalha com a esperança e ela sempre vence.
 Só quero terminar logo pra ficar no passado, só quero que a dor não se demore a ir embora. E de tantas palavras jogadas ao acaso, algumas conseguem fazer sentido, mesmo que eu mesma não faça sentido, nem pra mim nem para os outros. Sou só uma incógnita cheia de erros e difícil de ser resolvida, intensa e indecisa demais. Talvez nunca se resolva ou seja só drama de adolescente. Mas enquanto a idade não mudar os fatos e o imóvel não começar a se mover, eu continuo na linha branca, indo e voltando, como quem não sabe o que quer.
  

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Era um Garoto e Como Eu Amava Beatles e os Rolling Stones

Tudo estava girando, minha cabeça estava pesada, e a música alta me ajudava a não pensar. Levei uma garrafa recém aberta a boca, ingerindo a maior quantidade de álcool que consegui. Isso fazia minha garganta queimar, mas eu não me importei, não enquanto os acordes não terminassem. [...] Metade da minha culpa tinha ido com outra garrafa, e mais outra e mais outra. Outros acordes começaram, e só restou a música, o bom e velho rock n’ roll, era tudo o que fazia sentido pra mim naquele momento. Fechei os olhos e deixei com que minha cabeça guiasse o corpo, oh como aquela sensação era boa. Os problemas do amanhã só seriam resolvidos no amanhã, hoje não, não enquanto a mente ébria embalasse a guitarra, não enquanto minha voz alcançasse os ouvidos. Acompanhava o refrão e fazia coro, era como se gritasse a alma, em cada palavra, em cada sacolejo as coisas sumiam, tudo ao meu redor, eu não sentia mais as pessoas a minha volta, e tudo ficou bem em cada 3 minutos que passavam, até que os acordes terminavam. E depois daquele dia eu sei, tudo vai ficar bem, enquanto os acordes não terminar. 

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Petróleo do Futuro

As palavras que preenchiam vazios não servem mais pra mim, não para esse momento. Sou cheia de tanto vazio, ele me preenchem e não dá espaço pra o que é de verdade, apenas me deixa cheia, cheia do que não faz bem para os outros, nem pra mim mesma.
As linhas que hoje estão brancas de sentimento não me fazem escrever, talvez por serem cretinos demais, ou por não existirem pra mim. E assim me dou conta do vazio, quando as palavras não saem através dos dedos e do teclado, quando a caneta descansa ao lado do papel, sem vontade de fazer sentido. A inspiração de antes não existe mais, ela se foi, como que quem faz uma viajem, longa de mais para se dar o trabalho de voltar, me deixando aqui, com mais uma folha em branco, amassada, esperando o momento de ser jogada fora. Eu tenho esperado sair da folha em branco, esperado fazer com que meus sentimentos valessem meio texto. As pessoas sentem os sentimentos por trás de tantas lacunas de por quê? Ou as Indecisões criadas? Elas querem saber o que eu quero dizer com cada frase mal terminada? Acho que não. Eu crio o personagem, cabe somente a você se identificar ou não, caso não se identifiquem, são só meias palavras que não fizeram sentido aos sentimentos que você tanto presa. Mas são só sentimentos, não é mesmo? Mas a culpa está em mim, por não dar valor aos sentimentos alheios, quando não dou valor nem aos meus.  Assuma a responsabilidade que eu sou, apenas um amontoado de palavras, que ainda não saiu da folha em branco, não fez sentido no não fazer sentido, quando não se entende em que sentido eu quero dizer. É só mais uma novela tentando se encaixar num conto, essa sou eu, tentando se exclamar e tantas duvidas e interrogações, você não entende e eu não te culpo por não tentar entender.
 As palavras são meninas mimadas, elas saem sozinhas, se escrevem, e eu sou somente uma maquinas que elas usam sem perguntar, e quando dou por mim, já não sei mais sobre que assunto estava, elas somente continuam, se fazem, se juntam. E me explicam quando se fazem momentos em que não vivi, quando elas falam sobre coisas que eu não sei. O bater dos teclados,o riscar das canetas, e as meninas mimadas vão brincar com meus dedos, numa ciranda de sentimentos. Sinto que elas criam vidas entre o branco, mas como vou perguntar, se nem eu mesma sei? Não faz sentido como tanto sentimento que desconheço que sejam meus me preenche de certa forma. As palavras me usam, e de alguma maneira eu gosto de ser usada assim, se o vazio for se esvaindo, e nada mais restar.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Sereníssima

 Porque tudo uma hora cansa. E de tão cansado de se cansar, às vezes tu não desejas mais nada. Observando de uma outra perspectiva, as vezes daria certo, se a paciência fosse virtude minha, se eu apenas esperasse, mas o esperar cansa mais que qualquer outra coisa. Os sinais estão todos espelhados, no ar, palpáveis. Só não lhes vê quem não os quer, ou quem está cego pela ilusão do existir, poderia culpar a mim por isso?  E na escuridão, tão ilusória que era, menina fria e traiçoeira, não lhe deixa ver nada, só coisas que sua mente, um pouco ébria, lhe pregava para ser vista.
Talvez, talvez e talvez. Tão cheio de talvez você era, não mostrava nada, cheio de duvidas, garoto que não pensava em existir para ninguém, você existia para mim. Totalmente fora da ilusão de Dândi, que a literatura me criara, tu não era isto. E agora, observando tão longe, tão obscuro, seu caminho sem mim. Mas tu não vês as ervas daninhas.
 As tentativas, indo e voltando, como quem brinca num balanço, sem saber a hora de sair, e quando se voa alto, sem colocar os pés no chão, tu cai. Só quero que seja breve, se tens que partir, então parta, se não for embora, que fiques comigo, mas que não seja doloroso, ambas as coisas.
 Não lhe peço mais sinais que me mandem desistir, eles estão todos ai, de uma maneira ou outra. 

sábado, 7 de janeiro de 2012

505

Da janela do banheiro olhava seu rosto, a luz fraca dificultava a tentativa de ver a barba mal feita que crescera, rápido demais. Saíra de lá, o cheiro daquele banheiro sujo o enojava. Foi para o quarto, pequeno e bagunçado, se jogou na cama e olhando para o teto, a imagem de sua antiga casa lhe veio à mente, tão perfeitamente que lhe fez piscar os olhos, era real demais. As lembranças estavam intactas na sua mente, fresca em sua memória. Viu seu quarto bagunçado de adolescente rebelde, rebelde sem causa. Suas coisas, aquelas que tanto gostava e não possuía mais. Viu sua cama bagunçada, mas a bagunça não era imoral, não era suja, como das garotas que freqüentavam seu apartamento agora. Olhou para a porta e viu seus pôster, e sua garotinha aparecer lá. Sua princesinha. Os mesmos olhos, brilhando de inocência idade, sua estatura minúscula o fazia rir, e seus sonhos de nunca vê-la crescer voltar. Agarrou o sonho com força, vendo ele se esvair, sua garotinha crescera, cedo demais. Seus olhos estavam fixos no teto, lacrimejavam, ele não chorou quando ela se foi, não choraria agora. A sociedade era suja, ele sabia, aprendera a conviver com aquilo, com o futuro se partindo, como se a cada dia não fosse mais existir. Levantou, pagou as chaves e saiu, os bares estavam todos lá, abertos, a espera de mais um descontente, a espera de mais um copo para servir. Uma ultima dose.